quinta-feira, 24 de junho de 2010

DA HOMEOPATIA NAS DOENÇAS MORAIS

DA HOMEOPATIA NAS DOENÇAS MORAIS
Pode a homeopatia modificar as disposições morais? Tal é a questão que se
colocam certos médicos homeopatas, e à qual eles não hesitam em responder
afirmativamente, apoiando-se sobre os fatos. Tendo em vista a sua extrema gravidade, vamos examiná-la com cuidado de um ponto de vista a que nos parece ter sido negligenciado por esses senhores, todos Espiritualistas e mesmo Espíritas que são, sem dúvida, porque há bem poucos médicos homeopatas que não sejam um ou o outro. Mas, para a inteligência de nossas conclusões, algumas explicações preliminares, sobre as modificações dos órgãos cerebrais, são necessárias, sobretudo para as pessoas estranhas à fisiologia.
Um princípio que a simples razão faz admitir, que a ciência constata cada dia, é que
não há nada de inútil na Natureza, que, até nos mais imperceptíveis detalhes, tudo tem um objetivo, uma razão de ser, uma destinação. Este princípio é particularmente evidente pelo que se prende ao organismo dos seres vivos.
De todos os tempos, o cérebro foi considerado como o órgão da transmissão do
pensamento, e a sede das faculdades intelectuais e morais. É hoje reconhecido que
certas partes do cérebro têm funções especiais, e são afetadas a uma ordem particular de pensamentos e sentimentos, ao menos no que concerne à generalidade; é assim que, instintivamente, coloca-se, na parte anterior, as faculdades que são do domínio da inteligência, e que uma fronte fortemente deprimida e estreita tem para todo o mundo um sinal de inferioridade intelectual. As faculdades afetivas, os sentimentos e as paixões, por isto mesmo, têm sua sede nas outras partes do cérebro.
Ora, considerando-se que os pensamentos e os sentimentos são excessivamente
múltiplos, e falando deste princípio de que tudo tem sua destinação e sua utilidade, é
permitido concluir que, não só cada feixe fibroso do cérebro corresponde a uma faculdade geral distinta, mas que cada fibra corresponde à manifestação de uma das nuanças desta faculdade, como cada corda de um instrumento corresponde a um som particular. É uma hipótese, sem dúvida, mas que tem todos os caracteres da probabilidade, e cuja negação não infirmaria as conseqüências que deduziremos do princípio geral; ela nos ajudará em nossa explicação.
O pensamento é independente do organismo? Não vamos discutir aqui esta
questão, nem refutar a opinião materialista segundo a qual o pensamento é secreta do pelo cérebro, como a bile o é pelo fígado, nasce e morre com esse órgão; além de suas funestas conseqüências morais, esta doutrina tem contra si de nada explicar.
Segundo as doutrinas espiritualistas, que são as da imensa maioria dos homens, a
matéria, não podendo produzir o pensamento, este é um atributo do Espírito, do ser
inteligente, que, quando está unido ao corpo, se serve dos órgãos especialmente
destinados à sua transmissão, como se serve dos olhos para ver, dos pés para caminhar.
O Espírito, sobrevivendo ao corpo, o pensamento também o segue.

A mesma causa produz a expansão ou aparada do desenvolvimento dos órgãos
cerebrais, segundo as modificações que se operam nas preocupações habituais, das idéias e do caráter. Se as circunstâncias e as causas que agem diretamente sobre o Espírito, provocando o exercício de uma aptidão ou de uma paixão, permanecida até então no estado de inércia, a atividade que se produz no órgão correspondente, a ele faz afluir o sangue e com ele as moléculas constitutivas do órgão que cresce e toma da força em proporção dessa atividade. Pela mesma razão, a inatividade da faculdade produz o enfraquecimento do órgão; como também uma atividade muito grande e muito persistente pode conduzi-lo à desorganização ou ao enfraquecimento, por uma espécie de desgaste, assim como ocorre a uma corda muito esticada.
As aptidões do Espírito são, pois, sempre uma causa, e o estado dos órgãos um
efeito. Pode ocorrer, no entanto, que o estado dos órgãos seja modificado por uma causa estranha ao Espírito, tal como doença, acidente, influência atmosférica ou climática; então são os órgãos que reagem sobre o Espírito, não em alterando suas faculdades, mas em perturbando-lhe a manifestação.
Um efeito semelhante pode resultar das substâncias ingeridas no estômago como
alimentos ou medicamentos. Estas substâncias ali se decompõem, e os princípios
essenciais que elas contêm, misturados ao sangue, são levados, pela corrente da
circulação em todas as partes do corpo. Está reconhecido, pela experiência, que os
princípios ativos de certas substâncias se dirigem mais particularmente sobre tal ou tal víscera: o coração, o fígado, os pulmões, etc., e ali produzem efeitos reparadores ou deletérios segundo sua natureza e suas propriedades especiais. Alguns, agindo desta maneira sobre o cérebro, podem exercer sobre o conjunto ou sobre partes determinadas, uma ação estimulante ou estupefaciente, segundo a dose e o temperamento, como por exemplo, as bebidas alcoólicas, o ópio e outros.
Nós nos estendemos um pouco sobre os detalhes que precedem, a fim de fazer
compreender o princípio sobre o qual se apoia, com uma aparência de lógica, a teoria das modificações do estado moral por meios terapêuticos. Este princípio é o da ação direta de uma substância sobre uma parte do organismo cerebral tendo por função especial servir à manifestação de uma faculdade, de um sentimento ou de uma paixão, porque não pode vir ao pensamento de ninguém que essa substância possa agir sobre o Espírito.
Estando, pois, admitido que o princípio das faculdades está no Espírito, e não na
matéria, suponhamos que se lhe reconhecesse, a uma substância, a propriedade de
modificaras disposições morais, de neutralizar um mau pendor, isto não poderia ser senão pela sua ação sobre o órgão correspondente a esse pendor, a ação que teria por efeito deter o desenvolvimento desse, de atrofiá-lo ou de paralisá-lo se está desenvolvido; tornase evidente que, neste caso, não se suprime o pendor, mas a sua manifestação, absolutamente como se se tirasse a um músico o seu instrumento.
Provavelmente, foram os efeitos dessa natureza que certos homeopatas
observaram, e lhes fizeram acreditar na possibilidade de corrigir, com a ajuda de
medicamentos apropriados, os vícios tais como o ciúme, o ódio, o orgulho a cólera, etc.
Uma tal doutrina, se fosse verdadeira, seria a negação de toda responsabilidade moral, a sanção do materialismo, porque então a causa de nossas imperfeições estaria só na matéria; a educação moral se reduziria a um tratamento médico; o homem mais mau poderia tornar-se bom sem grandes esforços, e a Humanidade poderia ser regenerada com a ajuda de algumas pílulas. Se, ao contrário, como isto não parece duvidoso, as imperfeições são inerentes à própria inferioridade do Espírito, não se o melhoraria mais modificando seu envoltório carnal, do que não endireitando um corcunda, dissimulando sua disformidade sob o talhe de sua roupa.
Não duvidamos, no entanto, que tais resultados tenham sido obtidos em alguns
casos particulares, porque, para firmar um fato tão sério, é preciso ter observado; mas estamos convencidos de que se desprezou sobre a causa e sobre o efeito. Os
medicamentos homeopáticos, por sua natureza etérea, têm uma ação de alguma sorte molecular; sem contradita, eles podem, mais do que outros, agir sobre as partes elementares e fluídicas dos órgãos, e modificar-lhes a constituição íntima. Se, pois, é racional admiti-lo, todos os sentimentos da alma têm sua fibra cerebral correspondente para a sua manifestação, um medicamento que agisse sobre esta fibra, seja para a paralisá-la, seja para exaltar-lhe a sensibilidade, paralisaria ou exaltaria por isto mesmo a expressão do sentimento, do qual seria o instrumento, mas o sentimento com isto não subsistiria menos. O indivíduo estaria na posição de um assassino ao qual se tirasse a possibilidade de cometer os crimes cortando-lhe os braços, mas que nisto não conservaria menos o desejo de matar. Seria, pois, um paliativo, mas não um remédio curativo. Não se pode agir sobre o ser espiritual senão pelos meios espirituais; a utilidade dos meios materiais, se o efeito acima fosse constatado, seria talvez de dominar mais facilmente o Espírito, de torná-lo mais flexível, mais dócil e mais acessível às influências morais; mas se embalaria de ilusões esperando-se de um medicamento qualquer um resultado definitivo e durável.
Isto seria de outro modo tratando-se de ajudar à manifestação de uma faculdade
existente. Suponhamos um Espírito inteligente encarnado, não tendo ao seu serviço
senão um cérebro atrofiado, e não podendo, consequentemente, manifestar as suas
idéias, seria para nós um idiota. Em admitindo, o que cremos possível à homeopatia mais do que a todo outro gênero de medicação, que se possa dar mais flexibilidade e sensibilidade às fibras cerebrais, o Espírito manifestaria seu pensamento, como um mudo ao qual teria se desamarrado a l íngua. Mas se o Espírito sendo idiota por si mesmo, tivesse a seu serviço o cérebro do maior gênio, com isto não seria menos idiota. Um medicamento qualquer não podendo agir sobre o Espírito, não poderia dar-lhe o que ele não tem, nem tirar-lhe o que ele tem; mas agindo sobre o órgão de transmissão do pensamento, pode facilitar esta transmissão sem que, por isto, nada seja mudado ao estado do Espírito. O que é difícil, o mais freqüentemente mesmo impossível no idiota de nascença, porque ele tem a parada completa e quase sempre geral do desenvolvimento nos órgãos, torna-se possível quando a alteração é acidental e parcial. Neste caso, não é o Espírito que se aperfeiçoa, são seus meios de comunicação.
http://www.espirito.org.br/portal/download/pdf/revista-espirita-1867.pdf

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